Este texto propõe uma reflexão sobre os desafios enfrentados na utilização de provas digitais e destaca a cadeia de custódia como ferramenta essencial para mitigar os riscos de manipulação e fragilização dessas evidências, contribuindo para a confiabilidade e segurança necessárias à efetivação da justiça.
A crescente digitalização das relações comerciais e sociais têm transformado a forma como as provas são apresentadas junto ao Poder Judiciário. E-mails, mensagens, registros de acesso e arquivos diversos são cada vez mais utilizados para comprovação de fatos, principalmente em processos envolvendo questões corporativas e empresariais.
Contudo, essa mesma digitalização apresenta desafios significativos para a segurança e confiabilidade dessas provas, isso porque, a natureza volátil das evidências digitais, especificamente, dos PrintScreen, combinada à facilidade com que podem ser manipuladas, gera uma fragilidade subjacente, colocando em risco a efetividade de sua utilização. Nesse contexto, a cadeia de custódia surge como um elemento essencial para garantir a integridade de tais informações.
Para facilitar a leitura, o presente artigo será dividido em três partes: a primeira delas, direcionada à fragilidade das provas digitais; a segunda, à cadeia de custódia e sua importância para comprovar a autenticidade de provas e, finalmente, a última parte será destinada para comentar sobre os desafios, inclusive legislativos, no que tange às provas digitais
Diferentemente das provas físicas, os vestígios digitais não possuem uma forma material imutável e são suscetíveis a alterações tanto acidentais quanto intencionais. Arquivos eletrônicos podem ser alterados, excluídos ou corrompidos sem deixar vestígios visíveis ou rastros imediatos de modificação. Isso ocorre porque, ao contrário dos documentos físicos, não há marcas ou sinais perceptíveis de alteração, e a volatilidade dos dados digitais exige cuidados especializados.
Por essa razão, o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado de forma contundente quanto à fragilidade das provas digitais, reforçando que, sem a observância de protocolos técnicos específicos, uma simples alteração pode comprometer a confiança das provas, tornando-as inadmissíveis, especialmente em processos criminais e cíveis (HC 828.054).
Dessa forma, tem-se que a ausência de uma coleta adequada das evidências pode resultar na desconsideração das mesmas, prejudicando não só a parte que as apresenta, mas comprometendo a própria confiança no processo.
2. Cadeia de Custódia: Conceito e Relevância
A Lei nº 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, trouxe avanços significativos ao estabelecer regras expressas para a cadeia de custódia, reguladas pelos artigos 158-A e seguintes do Código de Processo Penal (CPP). Mas, afinal, do que se trata?
Em síntese, a cadeia de custódia, embora pensada para o meio físico, também é aplicada ao meio digital, já que surge como um conjunto de práticas e procedimentos fundamentais para a preservação da integridade das provas. Seu objetivo é garantir que uma prova, desde o momento da coleta até sua apresentação final, permaneça intacta, imutável e livre de alterações externas. A cadeia de custódia se decompõe em várias etapas, como:
Essas práticas combinadas não apenas previnem alterações, mas também oferecem um registro completo e auditável do histórico das evidências, o que contribui diretamente para sua validade jurídica.
Com isso, ao manter uma documentação contendo todas as etapas do manuseio da prova digital, a cadeia de custódia oferece os seguintes benefícios:
Além da Cadeia de Custódia, soluções tecnológicas – especialmente quando baseadas em blockchain – vêm sendo aceitas para reforçar a cadeia de custódia, assegurando que toda movimentação dos dados seja imutável e facilmente auditável.
Apesar dos avanços, o manejo de provas digitais continua a enfrentar desafios, especialmente pela lacuna legislativa, Além disso, a necessidade de padronização dos procedimentos de coleta, preservação e análise, além da atualização constante dos profissionais envolvidos, também preocupam os profissionais da área jurídica. A complexidade técnica exige, não apenas a utilização de ferramentas especializadas, mas também a atuação de peritos, que podem verificar a integridade dos dados por meio de laudos periciais.
A norma ISO 27037, por exemplo, fornece diretrizes específicas para a preservação de evidências digitais, mas sua implementação prática ainda é necessária. A falta de padronização em muitas situações pode levar a discrepâncias na qualidade e na confiabilidade das provas, principalmente quando há presença de múltiplas partes envolvidas e diferentes tipos de dados a serem analisados.
Diante disso, tem-se que a fragilidade das provas digitais exige uma abordagem técnica e especializada para garantir sua confiabilidade em processos judiciais. A cadeia de custódia se posiciona como um pilar essencial para a preservação da integridade das evidências digitais, evitando a adulteração e fortalecendo a segurança jurídica. Ademais, a aplicação rigorosa de normas técnicas, como a ISO 27037 , aliada ao uso de tecnologias seguras, como blockchain, é fundamental para que as provas digitais se tornem tão seguras e específicas quanto às provas físicas, permitindo a apresentação de informações seguras e confiáveis.